Como estamos preparando crianças e jovens para o mundo?
A sociedade em que vivemos impõe novos desafios às relações sociais. O tempo, cada vez mais fragmentado e acelerado, a influência midiática, o consumo desenfreado e a pressão pelo sucesso estão entre os fatores que geram ansiedade e depressão. O avanço da tecnologia também modificou a forma de comunicação e interação entre as pessoas, abrindo espaço para relações de muita exposição, embora superficiais e efêmeras. No entanto, é preciso escapar do reducionismo que aponta os tempos atuais somente como perigosos – e invocam um saudosismo sem reflexão – percebendo o que há de positivo para a abertura de novos caminhos. Cabe a nós, famílias e educadores, acompanhar as novas gerações e estabelecer bases de reflexão e diálogo, a fim de aproveitar o que desses elementos nos aproxima e nos desenvolve, bem como aprender a colocar limites e oferecer parâmetros para aquilo que nos afasta e nos isola.
A vida em sociedade impõe regras que organizam e viabilizam a convivência e, dessa maneira, situam os sujeitos nas relações. Contudo, lidar com a exigência dessas regulações sociais nem sempre é tarefa fácil, afinal, pressupõe que se abra mão de impulsos e desejos em prol da coletividade.
Esse desafio assume características singulares nos diferentes períodos da vida. Na infância, as crianças dispõem de menos recursos para lidar com as frustrações e ainda não conseguem reconhecer e comunicar com clareza o que sentem e pensam. Por isso, faz-se necessário um trabalho que tenha como foco o conhecimento de si, bem como o reconhecimento do outro e das diferenças de cada um. Entendemos que os conflitos, cotidianamente experienciados pelas crianças na escola, são necessários ao desenvolvimento e devem ser vistos como oportunidades para que aprendam a expressar o que sentem, a coordenar diferentes pontos de vista e a buscar soluções aceitáveis para as partes envolvidas.
À medida que as crianças se aproximam da adolescência, os desafios ganham outras intensidades e formas, o que abre espaço para questionamentos, transgressões e, também, confrontos frente às regras e a autoridade adulta. As transgressões não necessariamente se apresentam como um fator negativo, uma vez que são estruturantes no percurso de construção da autonomia. Muitas vezes, os conflitos decorrem da dificuldade na autorregulação dos jovens em relação ao modo como trazem esses questionamentos.
Percebemos como sintoma social uma crise na autoridade, que tem repercussões distintas em diversos âmbitos. Observamos uma geração de adultos angustiados e incertos em como se posicionar na regulação dos limites de seus filhos. O que será que se esconde por trás disso? Seria a diminuição do convívio familiar e a crença de que o tempo que resta deve ser livre de embates? O medo de perder o afeto de nossas crianças e adolescentes ao apresentarmos limites? Ou será que as famílias projetam nos filhos a expectativa de que vivam sem frustrações?
Entendemos a autoridade como o exercício do poder embasado na responsabilidade e em parâmetros democráticos que privilegiam o bem comum. A ânsia por uma liberdade indiscriminada e desarticulada com os deveres é o que causa a maioria dos conflitos nas relações sociais. Exercer a autoridade – e não o autoritarismo – é mostrar aos nossos estudantes que há uma lei comum à qual todos nós estamos submetidos. Quem responde a alguém é quem tem responsabilidade; e somente com responsabilidade temos liberdade.
Atento a essas questões, o Gracinha valoriza a aprendizagem para além dos conteúdos acadêmicos. É pela vivência cotidiana, mediada por adultos educadores, que auxiliamos nossos estudantes em seu desenvolvimento pessoal, aprimorando seus recursos internos para lidarem com expectativas e frustrações que decorrem da difícil equação entre desejos individuais e vida coletiva. Para tanto, buscamos garantir momentos de diálogo e reflexão nas assembleias de classe, nas aulas com a orientação educacional, nos estudos do meio, na mediação de trabalhos em grupo, nos encontros do Grêmio e Coletivo, e nas diversas parcerias e redes de comunicação com a comunidade.
É por meio dessas vivências, dentro e fora de sala de aula, que estudantes reconhecem gradativamente o papel de cada um no espaço compartilhado. Estabelecer limites claros e coerentes é fundamental para que sintam segurança e sejam capazes de fazer escolhas éticas e buscar caminhos para os enfrentamentos cotidianos.
Equipe Técnica do Gracinha