“O comerciante apenas seguiu de acordo com a regra, agiu em legítima defesa. Portanto, esse tribunal o considera inocente. A regra é a agressão, a exceção é a solidariedade.”
Através dessa inversão de valores, o Núcleo de Aprofundamento Vicky Bastos deu vida à obra A exceção e a regra, de Bertolt Brecht. A peça transforma a opressão e a luta de classes em uma travessia pelo deserto de Jahi, inserido no contexto do sertão brasileiro nessa montagem.
Nós, atores e alunos, enxergamos essa dramatização como um ato político e pedagógico no contexto atual, chamando atenção para as violências mais intrínsecas da sociedade e do próprio indivíduo.
Cada personagem é uma alegoria. O comerciante representa aquele que oprime, e o cule, o oprimido. Em diversas passagens, essas alegorias tomam vozes de atores diferentes, representando a alteridade que precisamos para enxergarmos criticamente a sociedade em que vivemos.
A ideia de realocar o julgamento para um show televisivo teve como objetivo mostrar o sensacionalismo da mídia, trazendo para o contexto atual e causando incômodo no espectador pela aproximação com a nossa realidade, em que o apresentador se torna um pretenso-juiz na hora de transmitir as notícias.
Somos atores, bonecos e cenário. Tocamos tambores, fazemos um julgamento e participamos de um programa de TV. Somos responsáveis por toda a construção da peça, assim como somos responsáveis por aquilo que construímos socialmente. Como diz Sartre, cada escolha individual não carrega apenas uma responsabilidade isolada, mas de todo um grupo de pessoas – a arte é a forma que escolhemos para interferir no mundo.
Foram quatro dias com o auditório lotado de uma plateia pensante e crítica. A temporada das apresentações acabou, mas o grupo de teatro do Gracinha segue com suas inquietações e provocações.
Laura Braga
Aluna do terceiro ano do ensino médio e atriz do Núcleo de Aprofundamento Vicky Bastos